Esse ano a Marvel decidiu pegar todo mundo de jeito. Após iniciar sua nova fase, agora com personagens inseridos em seriados além de filmes e alguns retornos bem especiais, finalizamos o ano celebrando festividades com Hawkeye— a série que é, talvez, um dos melhores especiais de Natal já feitos.
Aliás, uma flecha com uma notinha acabou de avisar que esse texto contém spoilers!
Sabe aquele filme que você assiste todo Natal? Hawkeye vai causar aquela sensação de coração quentinho. Quando, claro, não está envolvendo o espectador em alguma sequência de ação. E existem diversos núcleos com potencial latente para isso.
Somos introduzidos a Kate Bishop, e para os que não acompanham os quadrinhos, agora podem saber: ela é peça fundamental dos Young Avengers e responsável por cenas icônicas nesta outra mídia. Agora, ela é apresentada como uma garota que sempre foi rica, autoconfiante, e capaz de revirar os olhos na hora certa. Mas também é dotada de carisma, simpatia, e uma curiosidade que tende a levar nossa protagonista para as mais complicadas situações. Kate é um achado entre todos os novos personagens aparecendo no audiovisual da Marvel esse ano, e ela é, felizmente, o coração da série.
A atuação de Hailee Steinfeld elevou todos os acontecimentos, não fosse ela, talvez a adaptação do encontro entre os Gaviões não fosse capaz de se sustentar. Jeremy Renner, ou melhor, Clint Barton, o famoso Gavião Arqueiro, se torna até tolerável devido a escolha certeira de Steinfeld no papel de Kate Bishop. Ao seu lado, todos os demais atores ganham brilho, são elevados. Cheia de remendos na cara do começo ao fim, mas com um sorriso no rosto capaz de conquistar até mesmo seus arquiinimigos.
Existe toda uma trama envolvendo Clint e sua tentativa de retorno para a família, vários easters eggs naquele próprio núcleo, e tempo para Linda Cardellini, que interpreta sua esposa, nos conquistar através de simples telefonemas. Ela, aliás, é o fio condutor que traz uma sensibilidade maior em Clint. E tudo começa quando citam ela mesma, Natasha Romanoff (Scarlett Johansson). Aliás, no seriado finalmente temos algum Vingador em claro luto pela perda dela. É doloroso que venha tão tarde, mas ainda assim, a aura de Romanoff atravessa todas as atitudes de Barton durante a trama.
Voltando para nossa sorridente e carismática protagonista, não é nada ruim que Kate esteja na companhia de sua mãe, Eleanor. Pois Eleanor é atuada de modo esplêndido por Vera Farmiga, atriz reconhecida por fazer absolutamente o melhor com seus papéis — aqui, não é diferente.
Kate e Eleanor sofrem juntas a perda do pai da menina muito cedo, e desde então, a mãe é quem gerencia a vida de riqueza delas. Uma vida para a qual Bishop filha dedicou aos esportes e aprimorar o corpo até seu limite, puxando o extremo. Tudo isso após presenciar Clint Barton numa cena heróica na infância. Ela tentou aperfeiçoar cada um de seus movimentos, mas só desenvolveu e compreendeu o que é ser um herói de verdade na companhia do Gavião.
É essa obsessão por Barton que localiza o primeiro conflito, envolvendo um leilão que não dá muito certo e acaba com a menina colocando as mãos no antigo traje do Ronin (quem Clinton tornou-se após o estalo de Thanos que destruiu metade do mundo). Aquele período é manchado por uma trilha de sangue interrompida por Natasha, mas agora o sangue nas mãos do aposentado Ronin envolve Kate, capaz de colocar o manto para se livrar de uma enrascada. Contudo, ao fazer isso, ela atrai atenção do próprio herói. Que agora sofre com a perda da audição, e essa escolha foi uma aproximação tardia do Clinton nos quadrinhos. Bem, bem tardia.
Eles logo se envolvem numa trama com uma gangue que se salva por conta de Echo, Maya Lopez (Alaqua Cox), uma futura peça chave na Marvel das séries. Ela é filha adotiva do Rei do Crime e detém uma personalidade repleta de raiva, luto, e coragem exalando pelas superfícies. Alaqua é, de fato, surda.
E o uso da língua de sinais permeia toda a trama. Echo, por sua vez, não deixa nada ficar em seu caminho: é uma personagem brilhante, repleta de futuro pela frente no MCU, e que no último episódio detém um papel fundamental em derrubar o estabelecimento do qual ela mesma fazia parte. Vale a pena também comentar que o futuro do MCU terá uma presença feminina bem forte: a própria Alaqua mostra isso. Uma atriz nativo-americana, que usa uma perna protética na vida real, e conquistou uma legião de fãs. Ela, aliás, ganhará sua própria série spin-off de Gavião Arqueiro.
Falar sobre as mulheres no seriado é importante pois são elas que fazem tudo se mover, e aqui, temos mais uma peça fundamental: Yelena Belova (Florence Pugh). Sua personagem já conquistou os antigos e os novos fãs do Universo Cinemático da Marvel. Ela primeiro aparece no filme “Viúva Negra”, e é a conexão mais bonita com Natasha (Scarlett Johansson) que temos em mais de dez anos de filmes.
Após o filme solo da irmã, no qual é introduzida, Yelena carrega o fardo de libertar outras viúvas, além de estar “aberta a contratos” e sendo recrutada para o futuro time montado pela ex-Shield de Julia Louis-Dreyfus (que se apresenta como Valentina Allegra de Fontaine). Yelena, aqui, em Hawkeye, possui uma missão simples: matar Clint Barton. Ela inicia com a mentalidade fixa de que ele foi o culpado pela morte da irmã.
Com muita sorte, uma Kate Bishop de coração enorme aparece em seu caminho e impede a ex-Viúva Negra de cumprir seu contrato. Sim, matar Barton não era apenas pessoal. Só que Kate não atrasa os planos da ex-agente do “Red Room” apenas na base da luta, pois nesses termos, Yelena é superior, mas ela triunfa ao conquistar a simpatia da assassina. As cenas entre ambas são, talvez, uma das melhores coisas da série.
Elas simplesmente clicam, a química da dinâmica em tela é inegável, e mal vemos a hora de ambas interagirem novamente. Fica um sentimento de que além de heroína, o papel de Kate Bishop é humanizar todas essas pessoas carregando uma quantidade gigantesca de dor dentro delas ao longo da série — uma tarefa que vem com preços altos. Mas ela o faz sem sequer perceber.
Hawkeye pode não possuir o ritmo mais acelerado para alguns, algo capaz de dar espaço para o pensamento de: vão deixar tudo para o final. E de fato, os dois últimos episódios são carregados de tramas se desenrolando rapidamente.
Por exemplo, é no último episódio que temos o clímax emocional de tudo. E ele não faz parte da própria série, mas de antes.
Da ausência de Natasha Romanoff.
Da culpa e sofrimento que isso causa em Clint, do vazio e da dor excruciante que o fato provoca em sua irmã, Yelena. É a forma tardia de finalmente homenagear a Viúva Negra: ela é o manto protetor dos seus amados durante toda a série. Mas quando Yelena e Clint dividem a tela num embate mortal, a atuação de Florence Pugh leva toda a audiência para uma experiência emotiva, um lugar de dor, raiva, ausência e luto. Seu amor por Natasha é um dos elementos mais bonitos desta nova fase do MCU. Veio tarde, muito tarde, mas veio.
Tão tarde quanto o retorno de Wilson Fisk (Vincent D’Onofrio), direto da Netflix. É um retorno que envolve a trama de Eleanor Bishop, e tudo que acontece por trás dos panos. Alguns podem, no entanto, decepcionar-se com o final. Entretanto, de fato, sentimos aquele saudosismo gostoso quando ele entra em cena. Ele foi peça-chave para Daredevil, a série, ter sido o sucesso estrondoso que foi. Infelizmente, tudo que envolve Fisk ocorre em sentimento de pressa.
A mesma pressa que não acontece nos primeiros episódios da série, podendo ser considerada até lenta. Caso Hailee, nossa Kate Bishop, não estivesse ali, talvez a história de Clint Barton e seu desejo de retornar para a família não fosse capaz de sustentar a atenção dos fãs. Mas é a camaradagem entre eles, o aprendizado, e a empatia de Kate que servem de força motora para tornar Gavião Arqueiro a série perfeita para o final do ano. Inclusive, o seriado é temático! Literalmente! Todos os eventos se desenrolam durante o período do Natal.
E agora Lucky, o cachorrinho viciado em pizza, o golden retriever que sempre precisa de um passeio ao ar fresco, gostaria de desejar a todos um excelente final de ano. Ele também manda outro recado: o futuro da Marvel, no audiovisual, é inclusivo e também, repleto de mulheres cheias de força, habilidades e atuações ímpares. Queremos mais Kate Bishop, mais Yelena Belova, mais Echo, e por que não, mais Eleanor Bishop e seus métodos não convencionais?
E que elas venham com a presença firme de Yelena, a determinação de Echo, e o mesmo protagonismo dado para Kate, a verdadeira dona da série. Resolvendo problemas, criando problemas, colocando os pés no chão. Fazendo amigos no caminho e inimigos colaterais. Mas ainda assim encantada com novas flechas, aprendizados, e desbravando essa nova leva de heróis que já se mostram conquistando o coração de todos nós.