CRÍTICA | Belfast em um olhar intimista que perdura nos momentos atuais.

Candidato ao Oscar 2022 com 7 indicações em 7 categorias diferentes – e garantindo um efeito inédito não só para a Academia, mas também para o diretor e roteirista Kenneth Branagh, Belfast é um projeto que indicações ao Oscar não são páreo para o que é falado por aqui.

Para quem conhece Branagh sabe que ele é um ator cuja a influência vem bastante do teatro, principalmente por William Shakespeare, onde realizou diversas adaptações das peças dele para o cinema, sendo diretas ou indiretas, com apenas utilizando de referências. Saindo do mundo de Shakespeare, Kenneth dirigiu e atuou em outros projetos que fujam muito da sua “essência teatral”: dirigiu Thor, Cinderela, atuou em Harry Potter e a Câmara Secreta e em seu trabalho mais recente, é o detetive Hercule Poirot e o diretor de Assassinato de Expresso Oriente e Morte no Nilo, ambos baseados no romance homônimo de Agatha Christie. Com uma história de drama e uma pitada de comédia, Kenneth traz um filme mais contido que ele já dirigiu, se preocupando em passar ao espectador a razão principal do porquê da criação do filme.

Belfast conta a história de uma família protestante que vive na Irlanda do Norte dos anos 1960. A narrativa parte da perspectiva de um garoto de nove anos chamado Buddy, que mora com os pais (Caitriona Balfe e Jamie Dornan) e o irmão mais velho, em um período turbulento, em meio a conflitos políticos e religiosos, além de uma grande dívida da família.

No primeiro momento, o espectador fica por uns minutos confuso no início de um filme – vendido como sendo preto e branco e passando na década de 60. A confusão acaba ficando por conta do colorido e pelas imagens serem da Irlanda do Norte nos dias atuais, mostrando cenários de encher os olhos. De repente, voltamos na década de 1960, com adultos dançando e conversando, e crianças brincando na rua em completa harmonia, sem preocupações. Porém, tudo que é bom dura pouco e vemos sob o olhar de Buddy – uma criança de nove anos que estava brincando na rua com seus amigos – o início de um conflito de protestantes contra cristãos. Foi a partir daí, que a história daquela família muda: entre questões políticas e sociais, nós vemos tudo sob o olhar “mais infantil” de uma criança.

Famílias cristãs sob vigilância de protestantes, barricadas e escoltas policiais tornando-se novos vizinhos do bairro e por consequência o aparecimento de gangues, e ainda com tudo isso, tinha o espaço do que Buddy passava, tanto nessas situações quanto a de seu pai indo e voltando da Inglaterra, de encontrar o seu primeiro amor de infância na escola, de brincar e aprontar com sua prima nas ruas de Belfast, entre outros. Conforme vamos assistindo, percebemos que a história sendo passada ali, nada mais nada menos que é do próprio diretor e roteirista do longa, Kenneth Branagh.

Se falarmos sobre a base histórica de Belfast, o diretor nos conta da sua própria vivência, com nós tendo uma pequena noção do que foi os conflitos – chamados The Troubles – com vidas sendo perdidas e/ou familiares tendo que desistir do seu lugar para segurança da sua família. Aliás Kenneth traz no filme, não só essa questão de conflitos religiosos resultando numa guerra civil, mas sobre a xenofobia que os irlandeses poderiam ter em outros lugares da Europa. Isso sob o olhar de uma criança, deixa a história mais amenizada e aí é que está o grande problema. Claro que se colocarmos ao pé da letra os conflitos numa tela de cinema, seria muito mais chocante – então de certa forma é entendível a escolha de Kenneth, mas isso acaba afetando várias cenas que deveriam dar mais impacto pelos conflitos que resultaram numa época violenta e dolorosa para os irlandeses, dando a impressão de que os conflitos não foram nessa magnitude. 

Contudo, o longa tem seus momentos graciosos, com algumas referências de Kenneth na indústria cinematográfica – sendo elas diretas ou indiretas: uma cena em que Buddy está lendo a edição de Thor (1966) #139, já entende-se que o diretor teve seu contato com o herói desde pequeno e que mais tarde viria o convite da Marvel em dirigir Thor. Outra cena curiosa, é no momento em que Buddy está numa sala de cinema com sua família. As cenas passando na tela grande são coloridas, passando a mensagem de que o cinema, além de também fazer parte da infância de Benneth, era uma inspiração e também um acolhimento diante de todo o caos que estava acontecendo.

(Universal Pictures/Divulgação)

No elenco temos Jude Hill, Caitríona Balfe, Jamie Dornan junto aos veteranos Judi Dench e Ciarán Hinds, que são os que mais se sobressaem e que quando ambos aparecem interpretando os avós de Buddy, trazendo uma carga emocional muito grande na atuação e assim justificando as indicações de Melhor Atriz CoadjuvanteMelhor Ator Coadjuvante. Jude Hill é o ator novato e com carisma mostra uma atuação tão natural que nem parece estar interpretando.

O fato de ser um filme em preto e branco, foi utilizado como recurso inteligente, porque além de trazer essa ideia de estar passando na década de 60, ele traz uma divisão visual de quem é vilão e o herói nos conflitos entre cristãos e protestantes.

Concluindo, Belfast é um filme que mesmo funcionando de forma simplista, ele traz discussões pertinentes que, mesmo que a ambientação seja a década de 60, ainda é muito presente nos dias atuais, principalmente quando falamos da base histórica da capital da Irlanda do Norte, que acaba valendo para todo o mundo pelas questões sociais. O diretor, mesmo trazendo uma bagagem da sua vida sob o olhar de Buddy, homenageia aqueles que permaneceram, que deixaram e por todos que morreram em Belfast. E sim, o filme pode garantir estatuetas como Melhor Atriz/Ator Coadjuvante e por Melhor Roteiro Original.

O filme estreia nessa quinta-feira (10) por aqui!

Você também pode gostar

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *