Com estreia nesta quinta-feira (19), a recém filha encontrada de Chucky fará seu debut (estreia) nas telas de cinema em todo Brasil.
Com James Wan e Jason Blum produzindo, M3gan é um filme com uma abordagem já conhecida sobre o lado maligno da tecnologia, só que ao mesmo tempo, traz a tecnologia a seu favor no roteiro em uma (pequena) abordagem diferente do que já havíamos visto.
A primeira referência que temos quando falamos sobre Brinquedos Assassinos é Chucky, pois se levarmos em conta, além deles serem literalmente bonecos assassinos, a diferença é no início de toda essa matança.
Antes de falar propriamente sobre o roteiro, o filme em resumo traz Gemma (Allison Williams, de Corra!), uma tia que acabou de perder a irmã e cunhado e que acaba tornando-se responsável por sua sobrinha órfã Cady (Violet McGraw, A Maldição da Residência Hill). Só que Gemma tem em primeiro lugar a sua profissão de inventora de brinquedos robóticos (uma espécie de Geppeto dos tempos modernos) em uma empresa de tecnologia, o que torna “cuidar de sua sobrinha” um desafio e tanto, já que a mesma não estava pronta para se tornar mãe tão de repente. Então, vendo o estado de solidão da sobrinha, Gemma decide trabalhar no protótipo de um novo brinquedo que promete nunca mais ser esquecido: M3gan (Model 3 Generative Android).
Dito isso, vamos as questões.
O roteiro desenvolvido por Akela Cooper e baseado em uma história dela e de James Wan, como já dito, chega a ser batido em produções anteriores sobre o efeito da inserção da tecnologia inserida em nossas vidas, só que com o foco no brinquedo, seja ele de qualquer formato: como episódios de Black Mirror White Christmas ou Rachel, Jack and Ashley Too e a produção mais próxima sendo referência: Brinquedo Assassino (2019), o último filme do Chucky. A premissa era quase a mesma, com exceção do fator sobrenatural envolvendo o serial killer transferindo seu corpo para um boneco. Porém, da mesma forma que o tema já fosse de conhecimento de todos, a tecnologia também ficou a favor do que foi proposto, principalmente na época em que vivemos.
Com o avanço da tecnologia, há cada vez mais a sua inserção nos locais de trabalho e nos meios familiares, trazendo benefícios e malefícios para a convivência da sociedade como um todo e questões de como isso poderá nos levar futuramente: sermos escravos da tecnologia, cada vez mais inseridos nela e se distanciando da socialização humana, tornando-se cada vez mais superficiais ou vivermos como nossos antepassados longe dos “tempos modernos”? E esses pontos estão presentes no filme em forma de críticas.
Esse tom crítico começa desde o início do filme, de forma bem sorrateira e estreitando cada vez mais conforme o decorrer da história, chegando em seu ápice quando M3gan é introduzida: a substituição de um vazio deixado por alguém sendo preenchido por um brinquedo inovador “inofensivo” – que aliás logo no comecinho há um outro brinquedo que mais parece um Furby com dentes e mais arteiro e que leva ao mesmo patamar.
Ao sabermos das motivações de Gemma em ter o seu trabalho como uma prioridade e que, com a chegada de sua sobrinha acarretou insegurança, responsabilidade, pressão do trabalho e na urgência de acabar com a solidão da sobrinha Cady, Gemma confiou em sua auto capacidade (sob influência de insegurança e urgência), que a filha de Chucky veio ao mundo: M3gan. A ciborgue era um protótipo prometido como a próxima revolução dos brinquedos, “uma boneca realista programada para ser a maior companheira de uma criança e a maior aliada dos pais”, que pode ouvir, assistir e aprender enquanto se torna amiga e professora, companheira de brincadeiras e protetora da criança a quem está ligada.
M3gan acaba tornando uma espécie de babá para Cady, pela falta de atenção de Gemma em cuidar da sobrinha e estar pensando unicamente nos trabalhos, piorando ainda mais. Sem acompanhamento e com a ciborgue querendo proteger Cady a qualquer custo, que a matança começa a acontecer: de cachorro até adolescente fazendo bullying ninguém é poupado. Nessa questão de M3gan ser basicamente uma substituta dos pais, a roteirista Akela explica bem sutilmente o que seria a Teoria do Apego e de como ela está inserida na trama.
Mas é aquilo: quem disse que daria certo quando você faz algo na urgência, sem um acompanhamento, deixando totalmente vulnerável ao ambiente e principalmente sem um principal mecanismo que pode acarretar gatilhos de expressões humanas em um robô e fazendo-o tendo autoconsciência do não saber o que é certo ou errado (algo como Dolores na série Westworld).
Mesmo que o roteiro seja conhecido e acaba batendo em várias teclas do que já vimos, os elementos da nossa época inseridos na trama deram um toque melhor e que fez diferenciar levemente de outras produções: a inserção de Elsie, um modelo parecido com a Alexa e que controla todo o ambiente da casa, lê mensagens não lidas, músicas e afins, citar carros Tesla como referência de valores do mercado, referenciar sobre colecionáveis que não podem ser brincados (empresa Funki – coincidência? acho que não) ou até colocar uma nova versão de Titanium da Sia. Elementos condizentes à trama e que estão em nossa realidade.
Diante de tudo isso, é esperado que o filme seja um terror, como foi vendido comercialmente nos trailers ou até nas entrevistas, mas não se engane: não é. Há raros jumpscares e assustadoramente mais cômico. A cena que repercutiu na internet da boneca dançando no corredor, é bem por aí o nível. Você acaba não sabendo se é riso de ser engraçado ou riso de tensão mesmo – e mesmo que tenha o tom cômico, isso não afeta em nada, melhora por se. Esse filme é mais suspense e é envolvente, tornando certas cenas que causam tensão – inclusive há uma cena que quebra essa tensão, porém é rapidamente recuperado. O que é um ponto positivo, por não tornar a trama desinteressante ou de tornar o mesmo filme que já vimos em outras produções. Outro ponto positivo é que visualmente a boneca não traz um ar assustador, porém é explicado indiretamente como “algo que aparenta ser inofensivo/adorável, mas não é”. O roteiro peca em pontos da trama onde você pressupõe que coisas irão acontecer ou que aquilo que você concluiu era o que tinha que ser passado para o espectador, com as reafirmações em falas desnecessárias, já que tínhamos entendido do porquê dos acontecimentos.
No geral, M3gan teria potencial pra ser uma próxima geração do Chucky, mas ela deixa a desejar… um pouco. É um filme que funciona muito bem no suspense, envolvente, bem atual e caricato pelo tom cômico nas cenas, mas que utiliza de uma trama “porto-seguro” já vista anteriormente. Não é dos melhores filmes de “terror”, mas nem de longe dos piores ou dos medianos.
No final, podemos concluir que a vilã não é a ciborgue propriamente (com exceção da proteção a todo custo que a faz cometer crimes, claro), mas sim nós. O pensamento de que a tecnologia pode ser 100% confiável ou que, mesmo estarmos distantes de parentes ou amigos, uma conversa no whatsapp possa ajudar nesse distanciamento. De fato não, pois afetos não são substituíveis e a fala dele pode ter consequências graves futuramente (uma possível reabilitação), principalmente se for desde criança ou até adolescentes (pais derem tablets a seus filhos com 4 anos de idade sem controle parental ou não ter tempo de uso quando são adolescentes – exemplo personagem Theo na novela A Travessia, onde ele chega a bater na mãe por não ter mais tempo no computador).
Nota: 🤖🤖🤖🤖