ANÁLISE: O Caso Activision Blizzard e a cultura do assédio.

Mulher segura em esports e desenvolvimento de jogos? A resposta é não, dentro da Activision Blizzard.

Aparentemente, nem mesmo ambientes que prometem ser “o futuro” da indústria conseguem cumprir suas promessas.

A Activision Blizzard está sofrendo um processo no estado da Califórnia devido a uma série de alegações graves. Dentre elas, o que predomina é o modo assustador com o qual funcionários homens mantinham comportamento de fraternidade dentro dos espaços físicos de convivência. Um ambiente onde assédio contra mulheres tornou-se parte da “cultura de trabalho”. 

Você deve conhecer a Blizzard por jogos como World of Warcraft, Overwatch, Call of Duty, dentre outros. E o Departamento responsável pelo trabalho no estado da Califórnia veio com acusações longas. O arquivo, no total, possui 29 páginas. Nos documentos legais, podemos observar alegações como “trabalhadoras mulheres quase universalmente confirmaram que trabalhar para os acusados era parecido com viver numa fraternidade masculina”. 

Os homens também chegavam atrasados com orgulho, jogavam videogames por um longo período de tempo, demandando as tarefas para as mulheres, discutiam encontros sexuais em público e faziam piadas sobre estupro. Tudo na frente de outras funcionárias. Executivos do alto escalão da Blizzard e desenvolvedores cometiam assédio sexual em público, sem repercussões. 

E quando receberam reclamações formais antes do processo, não tomaram as medidas necessárias para proteção de suas funcionárias. 

Apenas 20% da Blizzard era composta por mulheres, e ainda recebiam menos que o valor dos homens. Elas também recebem um menor treinamento e salário para funções substancialmente similares. 

Vale a pena lembrar que a própria Blizzard usava de uma mulher, Tracer, como personagem principal de Overwatch; e em suas versões iniciais, a sexualização da personagem foi bem criticada, até que seu design fosse modificado. De certo, algumas mudanças foram feitas, mas aparentemente, nessa indústria, é tudo um festival de aparências.

Existem diversos agravantes no processo, sendo um deles, o fato das mulheres não-brancas acabarem se tornando alvos mais vulneráveis aos ataques dentro da companhia. 

“Vamos colocar personagens femininos e LGBQTIA+, porém continuar tratando nosso staff de mulheres com salários menores e tarefas mais complexas.” Esse parece ser o lema da Blizzard.

As consequências já estão acontecendo: o diretor de Diablo 4 (Luis Barriga), o designer de com o nome um dos personagens mais queridos em Overwatch, Jesse McCree, também saiu. E seguindo ele, Jonathan LeCraft, designer em World of Warcraft. McCree está envolvido no caso do “Cosby Suite”, caso onde um groupchat de executivos homens da Blizzard discutiam recrutar mulheres para “favores sexuais”.

A Blizzard, no entanto, não deu esclarecimentos sobre o motivo de afastar os funcionários. Isso aconteceu na BlizzCon de 2013. Isso acontece semanas depois das alegações da própria Blizzard sobre o desconhecimento sobre do “clima de fraternidade” local. 

Alex Afrasiabi, um desenvolvedor de longa data em World of Warcraft, teve fotos vazadas onde mostra seu hotel na BlizzCon 2013. Nelas, descritivamente, há um grupo de homens exaltando um quadro de Bill Cosby, que foi sentenciado por em 2018 por drogar e abusar sexualmente de Andrea Constand.

Cosby, hoje, é um homem livre devido a “falhas no processo judicial”. De todo modo, Cosby foi o nome dado ao quarto de Afrasiabi durante a BlizzCon em 2013. Afrasiabi e J. Allen Brack (ex-presidente da Blizzard), são os únicos nominalmente citados no processo. 

(Créditos da imagem: dotsports.com. Imagem com funcionários da Activision Blizzard durante a BlizzCon.)

“Durante um evento da companhia, Afrasiabi dava em cima de colegas de trabalho, dizendo que queria casar com elas, tentando beijá-las, e colocando seus braços ao redor delas (…) tudo na frente de outros funcionários, incluindo supervisores, que precisavam intervir e o afastar das mulheres.

Afrasiabi era tão conhecido por seu assédio, que seu quarto na BlizzCon foi chamado de ‘Quarto Cosby’.” Afrasiabi não respondeu a Kotaku, responsável pelo levante das imagens dele durante o evento. Em seguida, o acusado as deletou de suas redes sociais após a matéria. 

Uma antiga funcionária da Blizzard, Olivia Grace, foi ao twitter e confirmou que foi chamada ao tal quarto, também falou sobre outro membro do staff a tocar indevidamente, mais de uma vez, durante o evento. Aqui o tweet de Olivia: 

https://twitter.com/oliviadgrace/status/1420468265781010432 

A Blizzard fez declarações sobre o caso em algumas citações, como a de que “estão confiantes em sua habilidade em continuar o progresso (de Diablo 4), entregar incríveis experiências para seus jogadores, e seguir em frente para assegurar um ambiente seguro e produtivo para todos.” Outra pessoa da Activision Blizzard, parte de sua assessoria, falou que “Nós valorizamos diversidade e tentamos manter um ambiente de trabalho que oferece inclusividade para todos. Não há lugar em nossa companhia ou indústrias, ou qualquer indústria, para desvios de conduta sexual e abuso de qualquer origem. Em casos relatados, ações foram tomadas para resolver o problema.” Eles ainda acusam o Estado da Califórnia de distorcer as acusações. 

Enquanto isso, a DFEH (responsável pela acusação), pede indenização e punição para os danos provocados pelo ambiente de trabalho. Entre os problemas, há ainda a alegação da falta de pagamento para funcionárias mulheres. 

No entanto, devido ao andamento do processo, algumas informações não podem ser divulgadas para o público. Porém, diversas figuras do mundo dos jogos já demonstraram repúdio em redes sociais, e protestos foram feitos na frente do prédio da Activision Blizzard. Em números, a Activison Blizzard é uma empresa multibilionária com cerca de 9,500 funcionários. 

Por fim, um breve resumo de informações processuais:

Apenas 20% da Blizzard é composta por mulheres, lideranças de alto nível são feitas apenas por homens brancos, pela companhia as mulheres são menos contratadas, promovidas (e demitidas mais rápido). Os Recursos Humanos e executivos falhou em levar as alegações a sério, quando aconteceram; mulheres não-brancas são acompanhadas minuciosamente e não levadas em consideração para promoções, e a prática de “cube crawls” (onde homens iam até o ambiente de serviço das funcionárias, em suas mesas, para tocar no corpo delas sem consentimento). 

O caso segue em andamento, e todas as informações apresentadas foram coletadas ao longo de um esclarecimento que anda acontecendo desde o final do mês de julho, quando o processo veio à tona.

É, no mínimo, indignante que o padrão continue se repetindo. Após o “Caso Ubisoft”, ter que escrever sobre outro local onde as mulheres, e principalmente, mulheres não-brancas, são assediadas comumente, a esperança para a indústria de jogos parece residir nas mãos das próprias mulheres, acusações, e protestos. Um sentimento solitário, que muitas pessoas podem se solidarizar, no próprio ambiente de trabalho onde vivem. 

Enquanto isso, o processo continua.

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